sábado, 15 de outubro de 2011

Famílias de jovens mortos na Chacina da Via Show esperam há oito anos por julgamento de oficial da PM

E SE FOSSE UM PRAÇA?


Oito anos depois, o sequestro e a morte de quatro jovens na saída de uma festa, conhecido como a Chacina da Via Show, tornou-se uma ferida que não fecha para os parentes das vítimas. Dos PMs acusados do crime, quatro foram condenados, um morreu e outro foi considerado incapaz após ter diagnosticada doença mental. Mas um deles, o capitão Ronald Paulo Alves Pereira, único oficial entre os réus, ainda não foi a julgamento e continua integrando a PM. Mais do que isso: busca subir de patente.

Em 2010, Ronald participou do Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais — uma tentativa de chegar a major. Com autorização do comando, viajou a Recife (PE) entre de 31 de maio a 8 de junho. Entre os temas abordados no curso estão redução de índices de criminalidade e ações antibombas, preparativos para a Copa do Mundo de 2014. O resumo das atividades foi enviado à Secretaria de Segurança.

Ronald — que recebeu moção de louvor do deputado Flávio Bolsonaro por serviços prestados um mês após a chacina — está lotado do Departamento Geral de Pessoal (DGP). Segundo a assessoria de imprensa da corporação, ele aguarda função, mas continua recebendo salário. Já o curso seria uma praxe para oficiais.

Beneficiado por recursos da Justiça

A luta já dura anos, com todos os passos do processo sendo acompanhados pelos familiares dos garotos assassinados

No vaivém de recursos judiciais, o capitão conseguiu adiar o júri. De acordo com o promotor da 4ª Vara Criminal de Duque de Caxias, Reinaldo Lomba, em 2005, Ronald recorreu e o processo foi desmembrado. Em 2008, quatro policiais foram condenados. A pedido da defesa, o julgamento de Ronald foi adiado duas vezes em 2009.

— A primeira foi porque eu já tinha outro júri no mesmo dia. Na outra vez, 24 horas antes do julgamento uma prova foi incluída no processo, sem que a defesa tivesse acesso — explicou o advogado do réu, Ubiratan Guedes, que afirmou inocência de seu cliente.

Em junho deste ano, um dos réus foi absolvido: Luiz Carlos de Almeida. Na sentença, o juiz Paulo Rodolfo Tostes afirma: "o denunciado Ronald, que estava em serviço de supervisão de oficial do 15º BPM, foi dirigente da empreitada delituosa, valendo-se da liderança natural que exercia sobre os demais".

‘Réu solto não tem a mesma prioridade’

Antes mesmo do julgamento ter sido marcado pela primeira vez, o capitão Ronald já estava solto. Para o promotor Reinaldo Lomba, a justificativa para a demora no julgamento do oficial é a própria lei:

— A defesa dele conseguiu um habeas corpus antes do julgamento. E um réu solto não tem a mesma prioridade de um réu preso. Se ele estivesse preso, o julgamento já teria acontecido.

De acordo com o promotor, o julgamento deve ser marcado para o primeiro semestre de 2012.

A trajetória do capitão Ronald se confunde com processos judiciais. Apesar de aprovado no concurso público, ele foi considerado inapto no exame psicológico por "demonstrar irritabilidade e onipotência", segundo o laudo, o que indicaria um perfil incompatível com a função.

Graças a uma liminar obtida em 1995, o capitão Ronald conseguiu ingressar na Polícia Militar. A Procuradoria-Geral do Estado recorreu mas, em 1998, a 16ª Câmara Cível manteve a decisão anterior considerando a "ilegalidade do modo de avaliação psicológica", o que permitiu que ele permanecesse na corporação.

‘Continuo pagando o salário dele’

Se a vida do capitão Ronald parece não ter mudado, a das mães dos jovens assassinados nunca mais foi a mesma. Na noite de 5 de dezembro de 2003, Geraldo Sant’Anna de Azevedo Junior, de 21 anos, Bruno Muniz Paulino, de 20, e os irmãos Rafael Paulino, de 18, e Renan Paulino, de 13 anos, foram para Via Show, na Rodovia Presidente Dutra, e não voltaram mais. Desde esse dia, Siley Muniz Paulino, mãe de Bruno, e a concunhada Elizabeth Medina Paulino iniciaram uma árdua batalha por justiça.

— Meu marido ficou doente e morreu porque não aceitava a morte do nosso filho. Minha vida virou de cabeça para baixo — afirmou Siley.

Elizabeth lamenta a morosidade da Justiça:

— Depois de tantos anos, continuo pagando o salário desse policial que matou meu filho. Minha indignação só cresce por não ver justiça. É muito triste.

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